sexta-feira, 8 de julho de 2011

Plano de Carreira x meritocracia

É urgente, para todo o Rio Grande do Sul, Estado em que a educação pública vem enfrentando constrangimentos em avaliações de qualidade e de eficiência, que não se tire a esperança de um bom salário aos profissionais em educação. Esperança essa trazida pela aplicação do Piso Nacional Salarial aplicado ao nosso Plano de Carreira. Parece-me ser de conhecimento público nossa imensa defasagem salarial. Em sala de aula, somos todos, sim, todos, profissionais de curso superior e, ainda assim, amargamos salários próximos ou até abaixo (completivos os igualam) do mínimo. Somos responsáveis pela formação de todos, novamente sim, de todos os demais profissionais. Não há profissional, de área alguma, que não tenha passado pelas nossas mãos.
Fico me perguntando, será que aqueles tantos que criticam nosso Plano de Carreira o leram? Realmente o estudaram a sério? Caso afirmativo, venham para o debate e nos demonstrem o que têm contra ele. A mim, fica parecendo que o que há de tão terrivelmente ruim para estes é que ele, com o Piso Nacional como básico, nos leva a receber mensalmente – não esporadicamente, como quer a meritocracia – um salário razoável.
Vale lembrar ainda que nosso Plano de Carreira vem sendo, não apenas criticado por muitos que sequer o conhecem, mas desrespeitado por sucessivos governantes.  Somos uma categoria de profissionais que desde 2002, sim, sim, desde 2002 está sem promoção, prevista em nosso Plano de Carreira. Imagine você, trabalhar, especializar-se, estudar e, ainda assim, estar há nove longos e penosos anos sem ver promovido nem um único colega. Nem um sequer. E, apesar disso, não esmorecemos. Sabe toda a comunidade escolar que continuamos firmes: planejando nossas aulas, elaborando e corrigindo nossas avaliações, em nossas casas (fora de nosso horário oficial de expediente), ministrando nossas aulas, com salas lotadas, com alunos únicos e especiais. Todos eles especiais, pois filhos de trabalhadores, assim como nós.
Porém, falando em especiais, no caso de política salarial por mérito, como será feita, de maneira justa, a avaliação dos profissionais que trabalham com alunos inclusos, com dificuldades de aprendizagem das mais diversas? E daqueles que trabalham em comunidades extremamente empobrecidas, nas quais os educandos estão muito interessados na escola, porém naquele momento mágico da distribuição da merenda (em alguns dias, única refeição substancial)?
Em nossa profissão, a qual a maioria dos profissionais tem honrado heroicamente, uma vez que muito aviltados, trabalhamos muito mais que conteúdos didáticos. Com a instituição família em constantes mudanças, há formação de lares dos mais diversos, apenas a mãe, apenas o pai, apenas avós, apenas tios ou até mesmo apenas padrasto; com tempos cada vez mais curtos para a atenção à prole, trabalhamos a cada dia mais os valores básicos e somos, em muitos casos, a única referência adulta que essas crianças e adolescentes têm. Será que há meritocracia capaz de avaliar isso? Como vão nos avaliar e pagar por aquele olhar firme e encorajador? Por aquela reprimenda necessária e indicativa dos limites precisos e preciosos na formação de todo ser humano? Ou será que voltaremos a ser exclusivamente conteudistas? Em uma análise fria, facilitaria nosso trabalho. Porém, com sérios riscos de, a médio prazo, a canção “Another Brick in the Wall”, do Pink Floyd, tornar a fazer sentido pelo seu lado mais cruel.


Miriam Neumann Trindade/Professora da rede pública estadual


Publicado no Jornal Gazeta do Sul

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