sexta-feira, 10 de junho de 2011

Tarso Genro e o caso Battisti: “Itália tratou o Brasil como uma colônia”



Responsável pela concessão do refúgio político ao ex-ativista italiano Césare Battisti, o governador Tarso Genro comentou com o jornalista André Machado, do site Esquina Democrática, a decisão do STF. Tarso era ministro da Justiça do governo Lula quando houve o pedido de extradição. Além de comemorar a decisão do Supremo Tribunal Federal, o governador fez críticas ao governo italiano.

Confira a entrevista:

ESQUINA DEMOCRÁTICA – Como a decisão do STF sobre Cesare Battisti se relaciona com a sua decisão como ministro da Justiça de haver concedido refúgio político ao ex-ativista italiano?

TARSO GENRO – O pedido de extradição do Battisti foi um ato de arrogância do governo italiano em uma situação de decadência reconhecida internacionalmente. Atitude que ele nunca tomou quando o Battisti foi considerado refugiado político na França durante mais de dez anos. Este pedido feito pelo governo italiano cai nas mãos do ministro da Justiça que decide conceder o refúgio pelo fato dele ser um criminoso político. Os crimes que ele cometeu estavam na ordem da criminalidade política que permite a concessão do refúgio. Naquele momento o Supremo Tribunal Federal deveria ter interrompido o processo de extradição e liberado o Battisti como ocorreu com outros diversos italianos na mesma situação no Brasil.

ESQUINA DEMOCRÁTICA – …no momento em que o senhor como ministro da Justiça concedeu o refúgio político?

TARSO GENRO – Exatamente. A lei é clara. Ela diz que a concessão do refúgio por parte do ministro da Justiça equivale a uma decisão soberana do Presidente da República. Ele age por delegação do presidente. Mas o STF entendeu naquele momento que não deveria libera-lo na oportunidade e julgou – avaliando o pedido de extradição – que o Battisti deveria ser extraditado por que o seu delito não seria de natureza política, contrariando decisões anteriores sobre outras pessoas nas mesmas circunstâncias.

ESQUINA DEMOCRÁTICA – O senhor já leu o processo mais de uma vez. O senhor segue convencido de que o crime de Battisti foi meramente um crime político?

TARSO GENRO – Não sou eu que digo. Dentro do processo tem uma declaração do ex-ministro italiano da Justiça na época, Francesco Cossiga, que diz exatamente isto. Que ele era um criminoso político que queria instaurar uma ditadura de esquerda na Itália. Acusações que são muito semelhantes a algumas acusações que foram feitas também no Brasil na época do regime militar. Eu não entro sequer no mérito da razão, a persecução que o estado italiano fez naquele momento às pessoas que alçaram em armas foi justa e adequada. O estado reagiu como deveria ter reagido. Só que o fato do estado ter agido de maneira adequada e de acordo com as suas leis não quer dizer que aqueles rapazes que eram delinqüentes políticos na época não devam ser considerados criminosos políticos. Foi um ato de arrogância do governo italiano que quis tratar o Brasil como uma colônia, debochou do nosso sistema judiciário, ofendeu a um ministro do Supremo como se o Brasil fosse um país de segunda categoria. Então esta decisão do STF que devolve ao presidente da República a decisão foi uma decisão correta, equilibrada e digna de um tribunal de um país maduro e que tem um estado de direito a ser preservado.

ESQUINA DEMOCRÁTICA – Esta decisão que coloca Césare Battisti agora em liberdade no Brasil afeta de alguma maneira as relações com a Comunidade Européia em geral e com a Itália em particular?

TARSO GENRO – Em absoluto, inclusive os próprios estados europeus na oportunidade em que ocorreram estas violências concederam refúgios a pessoas que estavam nesta situação. Como a França que não pode ser acusada de não ser um estado de direito. A Espanha abrigou também refugiados políticos de outros países que se alçaram em armas, inclusive na América Latina.O Brasil é um exemplo de concessão de refúgio. Concedemos refúgio para um terrorista de extrema direita como o general (George) Bidault que tentou matar o De Gaulle (ex-presidente da França). O Brasil tem uma tradição de acolhimento. Acolheu o Stroessner (ex-presidente do Paraguai) como criminoso político e reconhecido como um ditador nefasto internacionalmente. Quando um país concede um refúgio – e foi este o meu despacho – o país não está avalizando o que foi feito. Está apenas dizendo que se inscreve nas normas internacionais de proteção ao refúgio.

ESQUINA DEMOCRÁTICA – O senhor tem uma opinião pessoal sobre se Battisti tinha ou não razão nos atos que cometeu?

TARSO GENRO – O Battisti se insurgiu, juntamente com centenas e milhares de jovens na Itália naquela oportunidade, de uma forma completamente equivocada. Como vários que cometeram atos de violência naquela oportunidade. Isto, de outra parte, não justifica que o próprio estado italiano tenha violado a sua legalidade. Colocou o serviço secreto da OTAN a combater as pessoas que estavam fazendo ações subversivas contra a democracia naquela época. Então houve uma violação recíproca do direito. Do estado italiano que se socorreu do serviço secreto da OTAN – e tem denúncias na Anistia Internacional de torturas que foram cometidas naquela época nos porões da própria democracia – o que obviamente não justifica o que as pessoas fizeram, mas também não justifica que o Battisti e os outros sejam tratados como criminosos comuns.

Via Aldeia Gaulesa

4 comentários:

  1. Oi, Gelso,

    Gostaria de dizer que vimos ontem, com certo nojo, a "cobertura" dos telefornais acerca dessa questão; embora considere que Cesare Battisti não seja um revolucionário político, mas apenas uma pessoa que agiu dentro de um partido radical de esquerda bastante equivocado, e lá tinha funções típicas de "segurança", isto é, cumpria as tarefas onde entrava a "necessidade" de empunhar armas e fazer "justiçamentos" ou simples assaltos para prover fundos à organização, bem, apesar disso tudo, o que vimos ontem foi de pasmar: antes da verdade, os telejornais tentaram mais uma vez impor a pecha da incompetência na política externa brasileira, e ignoraram os 6 votos favoráveis à Cesare, destacando os 3 votos contrários a ele. O que importa para a mídia, vê-se claramente mais uma vez, é estigmatizar o governo diante da "opinião pública"; mais que isso, é SER A OPINIÃO PÚBLICA, manipulando o entendimento das massas, não postas a discutir os problemas, mas engolir as "verdades" tidas e havidas por inquestionáveis. Como a irredutibilidade passa por coragem, alguns caem, mas, como diz o ditado popular - hoje amanheci com vários deles na cabeça - "o que não enverga, quebra".

    A entrevista do Tarso é razoável, mas somente se empunhamos também a bandeira de seu parcial entendimento. A Itália, por menos democrática que fosse (pois não existem regimes democráticos em nossas democracias), não era um Estado totalitário, nem mesmo autoritário. E as ações de Battisti foram muito mais além do que seria razoável nas condições da época. Isso, enfim, discute-se, mas não o privilégio do governo brasileiro de, formado seu parecer, defendê-lo de maneira soberana, sem ceder às pressões externas.

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  2. Se Battisti fosse um militante fascista, um terrorista de direita, o governo brasileiro não teria dúvida alguma: entregaria o meliante ao governo italiano. A questão, meus amigos e amigas, é puramente ideológica. E o pior de uma ideologia atrasada e caduca.

    Tarso chama Berlusconi e seu governo de decadente e arrogante, mas não é apenas o Berlusconi que quer a extradição de Battisti, é a justiça italiana. E a Itália não é um Irã, não é uma Cuba, é um país que vive há mais de 60 anos em regime democrático, com alternância no poder. Se Berlusconi e a direita italiana estão no poder é porque é desejo do povo italiano. O governo brasileiro -- porque a decisão de conceder o refúgio não foi do STF, mas do presidente da república -- está a se intrometer em assuntos internos e históricos do povo italiano. A luta armada que ocorreu na década de 70 na Itália -- capitaneada pelas Brigadas Vermelhas que matou o primeiro ministro Aldo Moro -- foi o vietnam italiano. Este é um assunto que apenas os italianos e tão somente os italianos deveriam resolver. Infelizmente, o governo brasileiro guiado por uma esquerda atrasada, ressentida e decadente, resolve fazer essa grande asneira. E está certo o governo italiano ao dizer e enfatizar: o Brasil fez uma atitude indigna. Estão confundindo ato de soberania com ideologia barata. Continuamos sendo uma república de bananas.

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  3. É incrível as pessoas que não tem um mínimo conhecimento de direito internacional e da própria história , se meterem de "Pato a Ganço" (sem nenhuma conotação com a seleção de Mano).
    Battisti, antes de ir para a França, viveu lépido e faceiro no México sem que a "democrática Itália" desse um pio.
    A democracia italiana nos anos 70 era só de fachada, pois o Estado de Direito foi diversas vezes vilipendiado, sob a desculpa da "caça aos comunistas".
    Cacciola, o banqueiro ladrão, fugiu para a Itália cerca de 10 anos e ficou gastando nosso dinheiro e rindo de nossa cara por vários anos. Só foi preso por ter ido se refestelar em Mônaco. Caso contrário, estaria até hoje na "civilizada" Itália, sem que ninguém se indignasse a extraditá-lo para o Brasil.
    Por que agora teríamos que entregar Battisti?

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  4. Vamos parar de falar e agir. Esse país é visto como colônia principalmente, nesse caso, não se preocupar com esse mundo de problemas que temos por aqui. Pensando nisso é justo que o Brasil se envolva em caso que não lhe pertence? Uma burrice, em minha opinião!!!! Belo texto!!
    E já que falei em atitude, segunda-feira à noite vê se consegue trazer algum professor lá para a Câmara, já faz uma cinco semanas que tenho ido até lá e não vejo ninguém. Assim vamos perder o tino e continuar sendo um paizinho de colônia. Professores cadê vocês!!!!! Valeu, um abraço!!!
    http://www.cronutopia.blogspot.com/

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