sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Amorim na Defesa: De barrigadas contra e a favor


Se você tem uma conta no Twitter e uma TL cheia de tuiteiros que se interessam por política, dos mais variados pontos de vista (como é o caso da minha), você presenciou ontem um desses fenômenos bem curiosos do comentário instantâneo na era da internet: uma sequência de barrigas com sinal trocado, mas absolutamente idênticas em sua forma. O Estadão publicou a notícia de que Nelson Jobim seria demitido, depois de mais uma coleção de insultos a colegas de governo, e junto com a notícia vinha a barriga de que Aldo Rebelo seria o mais cotado para assumir o Ministério da Defesa.

Foi o suficiente para que tuiteiros que apoiam incondicionalmente o governo e dizem “sim” a tudo passassem a inventar desculpas esfarrapadas para justificar a (imaginária) atrocidade. A minha favorita foi a pérola: “Aldo na Defesa seria positivo porque ele deixaria o Código Florestal em paz”, como se Aldo Rebelo já não tivesse destruído o Código Florestal brasileiro. Os blogueiros e tuiteiros que apoiam incondicionalmente o governo teriam prestado um serviço muito mais eficaz à Presidenta se, em vez de tentar justificar a (imaginária) atrocidade, tentassem apurar se a “notícia” do Estadão tinha procedência. Qualquer um com meia fonte que preste em Brasília teria sido capaz de apurar que não procedia.

Mas no campo dos opositores incondicionais do governo—falo aqui da oposição de esquerda e da oposição ambientalista, não dos demotucanos–, a coisa também não esteve melhor. Uma legião tomou a barriga do Estadão como se fosse notícia e passou a comentar: “É a prova de que o governo Dilma é um governo de direita”, “O PT superou o PSDB”, entre outras pérolas. Uma semana atrás, foi dito que “o fato de Jobim não ser demitido diz tudo”. E agora, que ele foi demitido e substituído por Celso Amorim, reconhecido por toda a esquerda—incluída a oposição de esquerda—como um dos responsáveis pelo que de melhor houve no Governo Lula? A demissão diz algo? Ou os fatos só dizem algo quando se coadunam com nossas ideias preconcebidas?


O indiscutível é que política é uma coisa muito difícil de se comentar na velocidade do Twitter se a sua única fonte de informação é a pior imprensa do mundo. Há muitas coisas a se criticar no governo Dilma mas, de um ponto de vista de esquerda, as trocas ministeriais, até agora, não estão entre elas. Antonio Palocci por Gleisi Hoffman, Alfredo Nascimento, um membro do que de pior tem a fauna política nacional, por Paulo Sérgio Passos, um técnico de carreira, Luiz Sérgio Oliveira por Ideli Salvatti e Nelson Jobim por Celso Amorim não contam, no meu léxico, como “retrocessos”.

A prova é que os mesmos apoiadores incondicionais do governo, que tratavam os críticos de Antonio Palocci como traidores do projeto petista e “amigos do PIG”, passaram a tecer loas a Glesi Hoffman minutos depois de sua indicação, esquecendo-se imediatamente de continuar defendendo aquele que, minutos antes, apresentavam como o paladino ribeiro-pretano do petismo injustiçado pelos “amigos de esquerda do PIG” ou pela “esquerda de que a direita gosta”, porque, como sabemos, no Brasil, quando cai um ministro petista, a culpa é sempre da esquerda.

Do lado de quem critica o governo não importa quais os fatos (de novo, falo da esquerda e do ambientalismo, não dos demotucanos), a mudança no Ministério dos Transportes ofereceu deliciosa e idêntica simetria. Há gente inteligente, que respeito muito, que até hoje acredita que é “credulidade petista” o fato de que Dilma fez um convite mandrake, inaceitável, a Blairo Maggi, como forma de xeque-matear o PR a aceitar como Ministro o homem que ela sempre quis, o técnico Paulo Sérgio Passos. Que o convite a Maggi era parte de uma manobra de Dilma para ter Passos como Ministro não é simplesmente um fato comprovado com fontes em Brasília. Foi algo anunciado com dias de antecipação no Twitter pela jornalista Cynara Menezes, que tem as extraordinárias qualidades de ser bem informada e de não brigar com as informações que apura. Mas tudo isso não impede que gente inteligente na oposição ambientalista continue afirmando que o fato apurado é “credulidade petista”. A crítica da credulidade também pode ser, ela mesma, vítima da mais ingênua credulidade.

Este blogueiro continuará onde sempre esteve: tentando ser fiel a um ideário de esquerda que seja capaz de combinar a redução da desigualdade com a urgente revisão do desenvolvimentismo que nos permita estabelecer outra relação com o meio ambiente; criticando o governo sempre que, segundo esse ideário, ele me parecer merecedor de críticas; apoiando-o sempre que, ainda segundo esse ideário, ele for merecedor de apoio. Continuarei fazendo questão de tentar dialogar com o leque mais amplo possível de apoiadores e opositores do governo que tenham alguma relação com o todo ou com partes desse ideário. Mas, acima de tudo, o meu respeito e admiração por cada interlocutor continuará dependendo muito menos da ênfase com que defendam ou ataquem o governo, e muito mais do respeito que demonstrem àquilo que é da ordem do factual.

Celso Amorim é o nosso novo Ministro da Defesa. Se você é de esquerda, não importa se apoiador ou opositor do governo, e não vê nisso motivo para comemoração, você pode continuar barrigando com o Estadão e afirmando que o Ministro será o Aldo. Afinal de contas, barrigadas, hoje em dia, não se corrigem, não é mesmo?

Um comentário:

  1. O que seria do jornalismo sem as barrigadas? Uma chatice. Vivemos tempos interessantes, na velocidade do twitter e das redes sociais. A informação é ilimitada. Você escolhe o ponto de vista, porque está tudo disponível.

    Sobre a chegada do Amorim, nada tenho a opor -- só espero uma coisa: que ele não invente de reatar namoros com os Ahmadinejads da vida.

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